Erga Omnes – A prisão domiciliar do devedor de pensão alimentícia

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Por: Gustavo Schneider Nunes*

No Brasil, a única modalidade de prisão civil por dívida é a decorrente do não cumprimento de obrigação alimentícia de forma voluntária e inescusável. Não se trata de pena imposta ao devedor de pensão alimentícia, mas de medida coercitiva que exerce uma espécie de pressão psicológica sobre o devedor a fim de que ele cumpra a obrigação.

A dívida alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que corresponde até as 3 prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo.

Se o devedor não pagar ou se não for aceita a justificativa por ele apresentada, o juiz decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de 1 a 3 meses, a ser cumprida em regime fechado, permanecendo em local separado dos presos comuns.

Entretanto, por ser a prisão civil uma medida invasiva à liberdade de locomoção individual, a despeito de importante mecanismo de coerção destinado à satisfação do crédito alimentar, o Superior Tribunal de Justiça relativizou a sua aplicação, baseado na dignidade da pessoa humana, na proporcionalidade e na menor onerosidade causada ao devedor, ao firmar a tese de que “o cumprimento da prisão civil em regime semiaberto ou em prisão domiciliar é excepcionalmente autorizado quando demonstrada a idade avançada do devedor de alimentos ou a fragilidade de sua saúde”.

Com a chegada da pandemia de coronavírus – Covid-19 foi editada a Lei nº 14.010, de 10 de junho de 2020, dispondo sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET), a tratar de diferentes áreas do Direito, incluindo o Direito de Família e Sucessões.

No art. 15, ficou estabelecido que, até o dia 30 de outubro de 2020, a prisão civil de dívida alimentícia, deveria ser cumprida exclusivamente sob a modalidade domiciliar, sem prejuízo da exigibilidade das respectivas obrigações.

Ocorre que, no fim de março deste ano, a 3ª Turma do STJ considerou que o contexto da pandemia ainda não permite que o devedor de alimentos seja encarcerado, mesmo com a perda de eficácia do art. 15 acima mencionado, devendo a prisão ser cumprida exclusivamente na modalidade domiciliar.

Reconhece-se o acerto do posicionamento adotado pelo STJ, por privilegiar uma execução equilibrada, entendida como aquela que busca satisfazer o direito do credor com o mínimo de sacrifício do devedor, não sacrificando a liberdade de locomoção individual deste, em tempos de pandemia, além do razoável e necessário.

Desse modo, atualmente, independentemente das características pessoais do devedor da pensão alimentícia (se idoso ou portador de doença grave), a prisão civil em regime fechado tem sido considerada incabível, sobretudo diante da precária situação do sistema carcerário brasileiro, marcada por um quadro de extremada insalubridade.

Por ora, para todos os casos, a prisão civil por dívida decorrente de pensão alimentícia só é autorizada por meio de prisão domiciliar, sem prejuízo de o credor vir a buscar a satisfação do seu direito pelo emprego de outras técnicas processuais executivas, como penhora, protesto judicial etc.

Trata-se, certamente, de uma medida de caráter excepcional, mas plenamente justificada pela excepcionalidade dos tempos em que vivemos, ante o agravamento das consequências advindas da pandemia.

*Gustavo Schneider Nunes é advogado e Professor

**Os artigos assinados não representam a opinião de O Defensor!

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